Monday 26 December 2011

Belleville Rendez-vous

Gostei. Bonecos deliciosos, grande detalhe.
Titulo original: Belleville Rendez-Vous
De: Sylvain Chomet
Com: Jean-Claude Donda (Voz), Michel Robin (Voz), Michèle Caucheteux (Voz)
Genero: Animação, Comédia
Classificacao: M/6

CAN/FRA/BEL, 2003, Cores, 78 min. (IMDB)

O pequeno Champion é educado pela avó, Madame Souza, para vir a ser um grande ciclista. Mas um dia, anos mais tarde, Champion, que está a participar no celebérrimo Tour de France, é raptado por dois misteriosos homens vestidos de negro. A avó e o fiel cão Bruno partem então à sua procura, numa viagem que os leva até Belleville, onde encontram as "triplettes", excêntricas estrelas do "music-hall" dos anos 30, que decidem ajudá-los. Na última edição dos Óscares, o filme foi nomeado nas categorias de Melhor Filme de Animação e Melhor Canção Original. in Publico

Critica:
O cão ladra e o comboio passa. Uma avó atarracada, carrapito ao alto, exibe os tímidos pêlos de um buço. Fica como um espelho da imagem que os portugueses levaram ao mundo. Só quem não notou o galo de Barcelos estampado na toalha de mesa ou o prato onde se lê "Fátima Maria" (detalhe, detalhe) ficará espantado quando, lá mais para a frente, Madame Souza ataca o piano para cantar, tcham-tcham, "Uma Casa Portuguesa". É uma senhora portuguesa com certeza, mas Madame Souza, a deliciosa protagonista de "Belleville Rendez-Vous", primeira longa-metragem de animação de Sylvain Chomet, até nasceu francesa, como uma evolução a partir da personagem da sua anterior curta-metragem "La Vieille Dame et Les Pigeons" (1998). "Originalmente, como 'La Vieille Dame et les Pigeons' teve muito sucesso no Festival d'Annecy, o meu produtor pediu-me para fazer mais duas curtas-metragens com a mesma personagem, a velha mulher que alimentava pombos com bolos", explica Chomet ao Y, por telefone, a partir de Londres. "Era suposto ser uma trilogia que formaria uma longa-metragem, com a mesma personagem. A segunda curta deveria chamar-se 'La Vieille Dame et les Bicyclettes' e a terceira 'La Vieille Dame et les Ouaouarons' [termo usado no Canadá francófono para designar uma espécie de rãs]. Basicamente o que aconteceu foi que quando comecei a trabalhar no 'storyboard' do segundo filme apercebi-me de que tinha tantas histórias que estava em condições de fazer uma longa-metragem. Como tivemos que alterar a personagem principal da velha senhora, por questões relacionadas com direitos, surgiu a Madame Souza. Tive que mudar o desenho e fiz dela uma portuguesa." Sim, Madame Souza tem um buço, veste-se de escuro e tem o cabelo enrolado num carrapito - quem desenha assim só pode fazê-lo com conhecimento de causa. Chomet inspirou-se nalguma figura real? Ele começa por negá-lo, mas depois admite: "Quando estava em Montreal, Candá, onde vivi durante dez anos, havia um restaurante que era dirigido por portugueses chamado 'Le Roi du Plateau'. Eu costumava ir lá e tornei-me amigo dos proprietários, o Michel e a Mónica Viegas. Talvez tenha sido por isso que quis ter uma personagem portuguesa no filme. Creio que fui influenciado por eles. Na verdade, é a voz da Mónica que se ouve na canção e no monólogo inicial. Além disso, andei a ver uns livros à procura de imagens, para ter uma ideia de como a Madame Souza se vestiria, o carrapito, etc. Em todo o caso, há muitos portugueses em França, são muito identificáveis porque se vestem sempre de escuro." Ah, o estereótipo cultural. Não se preocupem porque, para nós, o inglês de Sylvain Chomet também soa a sotaque de Pepe Le Pew. Além do mais, os "clichés" em "Belleville Rendez-Vous" também não deixam ilesos os franceses, como reconhece Chomet, "sempre a beber vinho e com longos narizes", nem os americanos. "Quando se faz uma caricatura de alguém tenta-se que seja o mais exagerada possível, caso contrário não tem piada. É preciso ir ao extremo", defende. traço à mão. Mas é preciso explicar o que faz Madame Souza num filme de animação franco-belga-canadiano-britânico - as origens da produção estão ligadas ao próprio percurso de Chomet (ver texto ao lado). Numa casa-torre portuguesa em França, com Paris lá ao fundo, uma avó desespera com a melancolia do seu pequeno e silencioso neto. Tenta o piano, depois de lhe notar o olhar atento ao ver Glenn Gould na televisão, oferece-lhe um cachorro. Descobre-lhe, finalmente, a paixão num álbum de recortes com bicicletas e ciclistas. Os anos passam e a casa-torre foi engolida por Paris. Sinais do progresso: a casa está agora inclinada por causa do viaduto ferroviário mesmo ali ao lado, o neto anafado de Madame Souza é agora um atleta delgadíssimo, um espeto com pernas musculadas, mas ainda melancólico e macilento, o seu rosto é só nariz. Champion, como se chama, treina para a Volta a França em bicicleta, com Madame Souza sempre atrás, no velho triciclo ou matraqueando pela casa com a sua bota ortopédica, para compensar uma perna mais curta que a outra. Ela há-de segui-lo para todo o lado, mesmo quando é raptado por um par de mafiosos que o levam num transatlântico descomunal para outra cidade. Champion tem a quem sair: Madame Souza pedala um oceano inteiro, contra marés e tempestades, para resgatar o neto. "Belleville Rendez-Vous" é uma animação contra-corrente, que quer mostrar o desenho numa altura em que neste campo os bonecos se batem pelo maior grau de realismo possível. Não, aqui tudo está na vibração do traço feito à mão por uma equipa de animadores. Se "À Procura de Nemo" era sobre peixes que agem como humanos, a fisionomia das figuras humanas em "Belleville Rendez-Vous" têm características animalescas. "Uma personagem que foi intencionalmente inspirada num cavalo de corrida é Champion. Os ciclistas são personagens fascinantes, nunca parecem estar a disfrutar da corrida, têm sempre estampado no rosto a dureza da prova. Acho que nunca vi um ciclista com um ar feliz, nem quando é o vencedor. E é verdade que as três irmãs parecem insectos gigantescos...", diz Chomet. As três irmãs: é preciso dizer que são um trio de velhas cantoras do "music-hall" dos anos 30, uma piscadela de olho a Betty Boop. São elas que abrem "Belleville Rendez-Vous", num delirante "show" a preto e branco que inclui ainda Josephine Baker, Django Reinhardt e Fred Astaire - vejam como o desenho dança -, para desaparecerem, de seguida, quando a emissão televisiva é interrompida. São figuras angulosas numa cidade de obesos, Belleville, que é onde o transatlântico e a história vão dar. Belleville, ou seja, Nova Iorque, uma megalópole com edifícios altos, táxis amarelos e uma Estátua da Liberdade bovina. É aí que se descobre Madame Souza como uma invulgar precursora de "street music", de música concreta, e se dá o seu encontro com as três irmãs, as "triplettes de Belleville", agora mais velhas, mas que ainda continuam a viver para a música. Fazem aquilo a que Chomet chama "jazz doméstico", uma música de persussão produzida a partir de objectos quotidianos, um jornal, grelhas de um frigorífico, um aspirador - e, agora, Madame Souza, que fez dos raios de uma roda de bicicleta o seu xilofone. "Eu tinha esta ideia, provavelmente inspirada no espectáculo 'Stomp', que vi em Montreal, onde os sons são produzidos a partir de objectos como vassouras, latas de lixo, etc., de fazer uma música rítmica do mesmo género." E foi assim que "Belleville Rendez-Vous", a canção, com música de Benoît Charest, se viu nomeada para um Óscar da Academia. guiados pelo movimento. Chomet diz que o som representa 50 por cento de um filme. Praticamente não há diálogos em "Belleville Rendez-Vous", que é uma animação guiada pelo movimento. Pensamos nos "cartoons" de Tex Avery, que desenvolveram uma lei de física muito própria, mas "Belleville Rendez-Vous" tem sobretudo o "timing" do burlesco de Tati, referência generosamente citada: está lá uma rosa-dos-ventos com o carteiro de Tati na sua bicicleta, um poster de "As Férias de M. Hulot", um excerto de "Jour de Fête". "Eu queria que as três irmãs vissem um filme na televisão e lembrei-me do Tati, por causa do período em causa e por causa do ciclismo. E depois, os animadores acharam que era engraçada inserir outras referências a Tati", explica o realizador. Para Chomet, a animação é, antes de mais, um trabalho de actor: cada animador tem de ser, em certo sentido, um mimo, para poder reproduzir os gestos na sua personagem. "Quero que as histórias passem através da animação, os elementos visuais, da realização, e não através do diálogo. Julgo que esse é o principal problema da animação que se faz nos Estados Unidos: eles falam o tempo todo, só para disfarçar o facto de as histórias ou a direcção não serem boas. Basicamente, o que fazem é contar a história em vez de fazer a história agir ['acting the story']. Foi por isso que decidi que tudo seria transmitido através da mímica, dos gestos." Quais são as vantagens ou dificuldades de trabalhar sem diálogos? "Não há nenhuma dificuldade. É mais difícil trabalhar com diálogo do que sem ele. Porque se pode dizer tudo com um só gesto ou com o som. Mesmo que não haja diálogos e se tenha imensos sons, há uma história que é contada. Os sons dizem qualquer coisa, a música também." Chomet considera-se "um observador", diz que tenta "ter o mínimo de invenção". A França que desfila no seu filme é popular, com ambientes tipificados, quase bilhete-postal, mas "bas-fond". A paleta não é colorida, mas glauca, cinzenta. O "look" é retro, mas não se trata propriamente de um exercício de saudosismo. "É mais interessante, graficamente, desenhar objectos dos anos 50 do que contemporâneos, são mais marcados e inspiradores. Dá mais prazer desenhar um televisor dos anos 50 do que um Honda Civic, percebe?" Errrr... "Desenhar pessoas velhas é mais interessante do que desenhar crianças, por exemplo. Porque as crianças não têm uma forma real, não têm as rugas, as marcas de pele dos idosos. É mesmo uma questão de linhas: há mais linhas num objecto ou numa figura velha. Se pegar na Torre Eiffel, é uma arquitectura complexa, consegue-se uma coisa muito forte ao desenhá-la. O mesmo não acontece se desenhar a Torre de Montparnasse, em Paris, que é um bloco negro, não há nada de característico." Onde é que entram os computadores, o contributo da animação digital, em "Belleville Rendez-Vous"? No oceano translúcido que se vê na terrífica sequência da travessia, mas também é uma forma de aliviar os aimadores de tarefas aborrecidas, como objectos que levam imenso tempo a desenhar porque não se alteram com o movimento - bicicletas, carros, comboios. "Não se vai prestar muita atenção a objectos que estão em pano de fundo, vamos olhar para as personagens, essas sim, minuciosamente desenhadas à mão." Em termos de técnica de cinema, Chomet afirma-se autodidacta. A par da sua formação em animação, rodeou-se de livros "para aprender os princípios básicos: onde se coloca a câmara, as personagens, como é a direcção de actores". "Quando faço animação, imagino sempre que há uma câmara real." "Belleville Rendez-Vous" é uma animação surrealista e desopilante, com cinema lá dentro: é a última imagem que se vê, um ecrã de cinema ambulante, a pedalar na paisagem. Ficou surpreendido com as nomeações para os Óscares de melhor filme de animação e melhor canção original? Chomet hesita, faz uma pausa. "Não sei... Fiquei surpreendido por termos duas nomeações." E depois: "Basicamente, a Academia premeia os filmes que rendem mais no 'box-office'. É uma forma de recompensar os 'bulldozers' que esmagam tudo por onde passam. É indecente que um filme como 'O Senhor dos Anéis' leve toda aquela quantidade de Óscares só por causa do 'box-office'. Não deviam chamar aos Óscares uma competição. Seria mais honesto dar os prémios directamente, a partir dos resultados das bilheteiras. Claro que eu sabia desde o princípio que 'Nemo' ia ganhar o Óscar. Não foi uma surpresa. Como já não há qualquer surpresa nos filmes de animação americanos, vê-se o 'trailer' e está lá o filme todo." Oh-la-la.

Kathleen Gomes

Saturday 24 December 2011

L'Aliva Marina

Uma bela experiência.


Web

Wednesday 21 December 2011

Missão Impossível 4

Sofrível ... pouco mais, para mim o tema está esgotado
Titulo original: Mission: Impossible - Ghost Protocol
De: Brad Bird
Com: Tom Cruise, Jeremy Renner, Simon Pegg, Paula Patton
Genero: Thriller, Acção
Classificacao: M/12

EUA, 2011, Cores, 133 min. (IMDB)

Quando o agente especial Ethan Hunt (Tom Cruise) é implicado num bombardeamento que assola o Kremlin de Moscovo, toda a agência FMI (Força de Missão Impossível) é desacreditada. Por esse motivo, o Presidente lança a "Operação Fantasma", com vista a extinguir a mais especializada equipa de espiões. Agora, Hunt tem apenas uma alternativa: juntar alguns ex-agentes e, por sua conta e risco, limpar o nome da agência e impedir um novo ataque previsto para breve. Porém, para isso, ele terá de aprender a confiar em estranhos de motivações duvidosas... O quarto filme do franchise "Missão: Impossível" baseia-se na popular série norte-americana para televisão que estreou na década de 1960, com actores como Martin Landau, Barbara Bain e Leonard Nimoy. O filme marca a estreia de Brad Bird ("The Incredibles - Os Super Heróis" e "Ratatui") na realização de uma longa-metragem de acção real. A produção é assinada por Tom Cruise e J. J. Abrams (produtor da série de culto Perdidos). in Publico

Critica:
E se vos dissermos que é capaz de estar aqui o mais descontraído e mais estimável dos quatro filmes adaptados da série de televisão dos anos 1960 para maior glória de Tom Cruise? Confessamos ter um fraquinho muito especial pelo delírio levado aos limites do desvairo do segundo episódio (filmado por mestre John Woo), mas entregar o comando desta quarta fita a um cineasta vindo da animação é uma solução feliz para resolver a contradição-chave do “caderno de encargos”. A saber: a necessidade de fazer um veículo “sério” à medida do seu actor/produtor/astro de Hollywood, por um lado, e as manipulações narrativas das missões, que geralmente se borrifam na plausibilidade, por outro. Manter o equilíbrio não tem sido fácil, e Brad Bird, autor dos “Super-Heróis” e de “Ratatui”, consegue-o reforçando o lado “cartoonesco” de todas estas missões com a piscadela de olho de quem sabe que quanto melhor a ilusão melhor a implausibilidade passa, e concentrando-se numa gestão de ritmo e de narrativa ilustradas por uma exemplar clareza de encenação. (Michael Bay, por exemplo, podia aprender umas coisinhas com o modo como as sequências iniciais da prisão russa e do Kremlin são filmadas e montadas.) Melhor ainda, Cruise abdicou finalmente do seu protagonismo sisudo, e acede a partilhar o écrã com uma boa equipa de secundários escolhidos a dedo (Jeremy Renner, Simon Pegg e Paula Patton). Não se trata, longe disso, de um “blockbuster” perfeito: o episódio do Dubai e o duelo final no silo automóvel são espremidos até ao limite do ridículo, o vilão é um “MacGuffin” que só lá está a fazer figura de corpo presente, a construção em patamares de video-jogo é tão preguiçosa que até irrita. Mas isso não deve ignorar que a função primordial de um filme como “Operação Fantasma” é ser uma bugiganga colorida, brilhante e descartável para o Natal - e quanto a esse caderno de encargos, missão cumprida: a descontracção desenvolta e eficaz que Bird aplica torna-o num entretenimento descartável de topo de gama. E está-se mesmo a ver que, se este filme também cumprir a sua missão nas bilheteiras, um quinto episódio não há-de tardar uma loja de barbeiro...

Jorge Mourinha