Título original: Alice in Wonderland
De: Tim Burton
Com: Mia Wasikowska, Johnny Depp, Helena Bonham Carter, Christopher Lee, Anne Hathaway
Género: Aventura
Classificação: M/12
EUA, 2010, Cores, 108 min. (IMDB)
Alice (Mia Wasikowska), agora uma rapariga de 19 anos, persegue um pequeno coelho e, tal como dez anos antes, entra na magia do País das Maravilhas. Aí, ela vai reencontrar os seus velhos amigos: o Coelho Branco (Michael Sheen), Tweedledee e Tweedledum (Matt Lucas), a Lagarta Absolem (Alan Rickman), o Gato Cheshire (Stephen Fry) e o extravagante e dedicado Chapeleiro Louco (Johnny Depp).
Mas o reencontro não é totalmente feliz: desde a sua partida, o pequeno lugar tem vivido dias sombrios sob o jugo da Rainha Vermelha (Helena Bonham-Carter) que, contra a vontade de todos, se apoderou do trono. O regresso de Alice parece um último reduto de esperança para todos. E, agora, ela e os seus companheiros terão de seguir o seu destino e travar uma guerra jamais imaginada. Será Alice capaz de devolver a alegria à terra de todas as maravilhas?
Inspirado pelos clássicos infantis "As Aventuras de Alice no País das Maravilhas" e "Alice do Outro Lado do Espelho", Tim Burton realiza uma espécie de sequela das histórias de Lewis Carroll. A banda sonora, muito aguardada pelos fãs, terá dois álbuns: um composto por Danny Elfman e outro - "Almost Alice" - constituído por 16 faixas que junta a música final do filme "Alice", escrita e composta por Avril Lavigne, com outras de vários artistas inspirados pelo filme, incluindo All American Rejects, 3OH!3, Robert Smith dos The Cure, Franz Ferdinand e Shinedown.
in Publico
Crítica:
Manicómio
Isto é um País dos Horrores, vivido (ou criado) no limiar da suportável desagradibilidade
Que Tim Burton pegue em Lewis Carroll não é por certo estranho nem extraordinariamente inesperado, porque o universo do escritor inglês sempre esteve à distância de um espelho do do realizador americano ("americano", mas em processo de anglicização, como nos últimos filmes se vinha vendo e este não desmente, bem pelo contrário). Que Carroll se ofereça assim à "burtonização" talvez seja mais digno de nota: Burton apropria-se de Alice e do País das Maravilhas sem fricção, uma espécie de "ocupação" pacífica e consentida, sem precisar de disparar um tiro. Tudo é orgânico e harmónico, numa sobreposição perfeita que torna inútil (ou pelo menos pouco profícuo) o exercício de dissecação.
Distinguir "isto é Burton" e "aquilo é Carroll": que importa, se a coisa se faz una? Diríamos que Burton pega - à letra - numa das características do livro de Carroll, o facto de ele se dirigir primordialmente à imaginação do leitor. E que é recorrendo à sua "imaginação de leitor" que Burton constrói a sua "Alice". A imaginação de Burton, conhecemo-la bem, e seguramente a reconhecemos aqui (donde, a impressão de familiaridade que já descrevemos). Surpresa? Surpresa nenhuma, ou só - se nos pusermos a pensar nisso - que essa imaginação trabalhe num diálogo directo com a fonte carrolliana, e surja imediada - mesmo "despoluída" - por outras imaginações de "Alice". Enfim, não conhecemos todas - há uma versão de Jonathan Miller que anda por aí nas prateleiras dos DVDs de importação - mas este é um filme Disney (uma produção Disney) que é o perfeito negativo da versão Disney que enformou, em tanta gente de tantas gerações, uma visão de "Alice no País das Maravilhas".
E é o negativo disso porque (para além de questões de invenção visual) intensifica, em vez de atenuar, a dimensão mais perturbante do relato de Carroll. O absurdo daquilo tudo, a loucura daquelas personagens todas. É evidente que isto não é País das Maravilhas nenhum, é um País dos Horrores, vivido (ou criado) no limiar suportável da desagradabilidade. Atenção, por exemplo, à paisagem (algo inóspita, por vezes "lunar", ou a lembrar um "pós-apocalipse") ou às cores do céu (cinzento, muito "bleak" - como a meteorologia inglesa?...). E ao modo como este tratamento "atmosférico", em fundo do tratamento das personagens, salienta o óbvio: como sempre em Burton o "pesadelo" mal se distingue do "sonho", e por muito que a promoção de "Alice" pareça dirigir o filme a um público infantil, a quem Burton de facto se dirige é aos adultos. O outro lado do espelho é um inferno, grotesco e distorcido.
E as 3D? Digamos muito brevemente duas ou três coisas: que são usadas de maneira muito menos ostensiva do que em "Avatar" (muito menos cansativa, também), e que se nota uma relação mais coerente entre o seu uso e a própria composição espacial. E ainda que, trabalhando mais sobre pintura (ou "como pintura") do que Cameron, Burton se diverte, nalguns momentos, a anular o relevo, a transformar os corpos dos actores em silhuetas planas, a fazer "2D" dentro do "3D". No mínimo, é divertido e inteligente. O frabjous day!.
Luis Miguel Oliveira
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